Jogo (homenagem a Nuno Júdice)

O Jogo

Abro a caixa do inverno. Tiro os ventos,
as rajadas da chuva, os bancos de neve de onde
fugiram todos  os pássaros. Desenrolo à minha
frente os pântanos do inverno, Ando à volta
deles para desentorpecer as pernas; sacudo
o frio das mãos, limpo a chuva que se me colou
aos cabelos. Depois volto a lançar os dados
– e avanço até à primavera.

Nuno Júdice, O meu primeiro álbum de poesia, selecção de Alice Vieira, Dom Quixote, Lisboa, 2007

O poema de Nuno Júdice, “O Jogo”, foi o ponto de partida para um tempo de sensibilização às caraterísticas do texto poético. Depois, como sempre fazemos em oficina de escrita, pusemos as mãos na massa, procurámos as nossas próprias palavras e experimentámos escrever. Como o poeta.

Abro a caixa do inverno. Ponho de lado o frio,
a neve que habita no alto do pinheiro, e a geada que
faz tremer a relva pela manhã. Retiro o gorro, as botas
e o cachecol. Separo o vento do meu caminho; construo dias
longos e noites curtas. Depois  volto a lançar os dados
– e avanço até à primavera.

Carolina Bastos

Abro a caixa do inverno. Tiro a geada, as rajadas de vento e os
bonecos de neve de onde fugiram todas as folhas e flores. Desenrolo à
minha frente menos tempo de sol e mais de escuridão do inverno frio.
Ando, ando e ando até chegar à lareira; sacudo o frio das
mãos; limpo o gelo que se colou aos cabelos. Depois volto a lançar
os dados, vou‑me embora das árvores adormecidas
–  e avanço até à primavera.

Joel Santos

Abro a caixa do inverno. Espalho o frio,
a geada, a chuva, o granizo, o nevoeiro e o gelo. Ponho à
mão bonés, cachecóis, botas, galochas, gorros,
camisolas de gola alta e chapéus de chuva. Monto
o aquecimento, abro a lareira: construo noites longas
e dias curtos. Depois volto a lançar os dados
– e avanço até à primavera.

Diana Loureiro e Débora Rodrigues

Abro a caixa do inverno. Tiro o frio,
as tempestades e as avalanches
de onde toda a gente tenta fugir. Vejo ao meu redor
o espírito do inverno. Tento compreendê‑lo
e saio à rua onde está tudo gelado
e frio. Os meus olhos congelam mas
a minha alma sente o que por ali paira. Depois
volto a lançar os dados – e avanço até
à primavera.

Gabriel Carvalho e Helena Esteves

Abro a caixa do inverno. Tiro as árvores despidas, clico no botão do
frio, coloco os bonecos de neve e preparo a pista. Espalho as folhas
por toda a pista, ligo o nevoeiro e a chuva, agasalho‑me com
um cachecol e um gorro, pego no guarda‑chuva e calço as minhas
galochas. Vou para a rua rebolar na neve e volto para casa para
receber o calor da lareira.
Depois volto a lançar os dados – e avanço até à primavera.

Luís Carlos Correia e Luís Filipe Sequeira

Abro a caixa do inverno. Preparo o gorro
e o cachecol, as árvores recheadas de neve de onde
caíram todas as folhas. Estendo ao meu
lado um manto de neve. Ando à volta
deles para destorcer as mãos; agito
a chuva dos lagos; desanuvio o nevoeiro
que está no ar. Depois volto a lançar
os dados e avanço até à primavera.

Diogo Vieira e Diogo Ferreira

Abro a caixa do inverno. Tiro o frio,
as tempestades de  granizo, as árvores sem folhas.
tiro do fundo da caixa os
casacos de pele. Avanço 5 casas
para desentorpecer as pernas; sacudo
a neve que se colou a mim
durante a caminhada e bebo uma
caneca de chocolate quente.
Depois volto a lançar os dados
– e avanço até à primavera.

Rafael Fernandes e Miguel Ângelo Ferreira

Abro a caixa do inverno. Tiro os bonés
o cachecol, o gorro, o guarda‑chuva, as botas e a
camisola de gola alta. Preparo a lareira,
o frio vai‑se espalhando pelas ruas e a
neve vai caindo. Vou distribuindo o aquecimento
pelas pessoas, dando luvas e bonés. Depois volto a
lançar os dados – e avanço até à primavera.

José Paulo Lopes

Abro a caixa do inverno, retiro o cachecol,
as camisolas de gola alta, as casas quentinhas.
desenrolo à minha frente
o chão molhado. Começo a correr sobre ele
para escorregar e cair. Abano a cabeça para
sacudir a neve, fecho o guarda‑chuva e
entro em casa. Depois volto a lançar os dados
e avanço até à primavera.

Virgílio Teixeira e Vítor Diogo Santos

Abro a caixa da primavera. Tiro o calor,
as brisas quentes que passam por nós,
observo a vegetação que renasce. Arrumo
a roupa do inverno e visto uma t-shirt
e uns calções lavadinhos de fresco. Lanço
os dados e avanço 7 casas e a meio do caminho
oiço os pássaros e as abelhas, vejo as andorinhas
a chegar de África e observo as flores a
cobrir as árvores despidas enquanto saboreio
umas cerejas. Depois volto a lançar os dados
– e  avanço até ao verão.

Rafael Fernandes e Miguel Ângelo

 Abro a caixa da primavera. Monto as flores nos
canteiros e vou enchendo as árvores de folhas e
flores. Espalho a relva ao lado dos canteiros.
Ando à volta dela para sentir o cheiro. Ouço
Os pássaros a cantar e as raízes a levantar a terra.
Chamo as andorinhas para poisarem nos
beirais do telhado. Depois volto a lançar os dados
– e avanço até ao verão.

Diogo Vieira e Diogo Ferreira

Abro a caixa da primavera. Tiro o sol,
as flores, os campos floridos e os bancos
de jardim. Preparo os campos verdes da
primavera e coloco de parte o frio, a chuva,
os cachecóis,  as luvas e as botas. Enfrento
a agitação dos animais, do calor e ouço o canto
dos passarinhos. Construo jardins, campos,
canteiros e novas paisagens. Em seguida,
recolho todos os frutos, volto a lançar os
dados – e avanço até ao verão.

Ana Cláudia Gonçalves

Abro a caixa da primavera. Tiro o cantar dos passarinhos,
o calor e as grandes planícies de flores
onde existem muitos seres vivos que as admiram e as invejam. Vejo claramente
o adormecer do frio e das tempestades.
Admiram‑me as mil cores da natureza
vistas pelo olhar puro
de uma criança. Depois volto
a lançar os dados e avanço até ao verão.

Gabriel Carvalho e Helena Esteves

Abro a caixa do verão. Distribuo a alegria,
o calor, os jogos ao ar livre e as férias. Separo as
t-shirts, os calções, as saias, os chinelos e os bonés.
Monto a ventoinha: construo noites curtas e dias longos.
Depois volto a lançar os dados
– e avanço até ao outono.

Diana e Débora

 Abro a caixa do verão. Tiro o calor, a alegria, o sol de onde
fugiram todos os amigos do inverno, a neve e o gelo. Desenrolo à  minha
frente os rios frescos do verão. Ando à volta deles para me
preparar para mergulhar, respiro o bom ar das árvores e das flores;
tiro a areia dos pés a cintilar e mergulho. Depois volto a lançar os dados
– e avanço até ao outono.

Joel Santos

Abro a caixa do outono. Encontro as árvores despidas,
os sons do outono, procuro roupas um pouco
mais grossas. Retiro as andorinhas que
vão para países mais quentes. Vejo‑as esticar
as asas e partir. Visto o casaco para poder
saltar por cima das folhas que caíram das árvores. Depois
volto a lançar os dados – e avanço até ao inverno.

Virgílio Teixeira e Vítor Diogo Santos