“Quando acordou, de manhã bem cedo, abriu os olhos sem saber onde estava, mas o quarto de paredes brancas, com quadros brancos, móveis brancos, chão branco, deixaram-na perplexa. Levantou-se e correu a abrir a janela branca. Para seu espanto, as montanhas eram cinzentas, as árvores e os jardins também. Percebeu que estava na Terra‑de‑onde‑as‑cores‑desertaram.”
Rosa pensou que estava a sonhar, mas o belisco tirou-lhe as dúvidas.
Bateram à porta. Era um velho senhor chamado Bernardo, líder do Grupo dos Restauradores das cores. Dirigiu-se a Rosa e disse-lhe:
– Este mundo nem sempre foi assim. As pessoas viviam alegres e sorridentes. Mas agora, sem as cores, não podemos ser felizes. A tristeza domina os nossos corações. Já não há vida nesta terra. Tudo tem a cor da morte. Grey não gosta de outra cor senão cinza e branco. Até proibiu as festas em honra do Arco‑Íris que costumávamos realizar todos os anos. Estamos a planear tirá-lo do trono mas não sem primeiro restituirmos as cores a este reino. Espero que esse dia esteja perto. Quando procurámos ajuda numa outra dimensão, apareceste tu. Não sabemos a razão, mas temos a certeza de que nos podes ajudar.
– Que posso fazer por vós?
– O primeiro passo é saber como desapareceram as cores. Algo nos diz que possuis essa informação.
– Vou contar-vos uma história que a minha avó me costumava contar. Era uma vez um reino, uma grande e próspera terra. Antigamente chamava-se Colorida e todos os anos havia uma festa em honra do Arco-Íris, seu padroeiro. Todos gostavam desta época festiva, todos menos o príncipe Grey que tinha as trevas no coração. Quando o rei morreu, Grey subiu ao trono e proibiu o Arco-Íris de aparecer no seu território. O Arco-íris recusou-se a ceder à exigência de Grey, mas este tinha dotes de feiticeiro. Lançou‑lhe um feitiço e nunca mais ninguém o viu. O tempo passou, todos notaram que as cores não tinham a mesma vida de outrora. As flores andavam cabisbaixas e as pessoas também. O Reino ia escurecendo e as cores acabaram por desertar.
A história que Rosa contou fez Bernardo perceber que as cores vinham do Arco‑Íris e não haviam desaparecido antes porque eram renovadas todos os anos no dia da festa. Mas agora não havia festa nem Arco-Íris nem renovação das cores.
Consultaram o Grande Livro de Todos os Feitiços Alguma Vez Lançados e, depois de o folhearem durante bastante tempo, descobriram que o Arco-Íris fora vítima do feitiço da descoloração. Rosa lera sobre isto num dos seus livros. O feitiço da descoloração é anulado com a poção da origem dos Arco-Íris. Faz-se com uma nuvem carregada de água, um raio de sol e uma pitada de qualquer cor. Nuvens não faltavam em Terra‑de‑onde‑as‑cores‑desertaram mas conseguir um raio de sol seria uma tarefa muito difícil e uma cor, impossível. Foi então que surgiu uma ideia.
– Podemos utilizar uma pitada de Rosa. – Disse Bernardo.
– Não estou a perceber.
– Eu explico. Tu serás a cor. Juntaremos um fio de cabelo teu aos outros ingredientes. Por isso foste a escolhida. Porque és uma cor e sabes da história. E assim poderemos acabar a poção.
Um dos obstáculos estava ultrapassado. A próxima meta seria arranjar o resto dos ingredientes. Bernardo apressou-se a trazer uma nuvem carregada de água, diminuindo-lhe o tamanho com a sua varinha. Para conseguirem o raio de sol tiveram de subir à montanha mais alta, que atingia o mais alto ponto dos céus. Aí, por cima das nuvens, poderiam ver o sol radiar. Subiram durante 225 horas.
Quando finalmente chegaram ao topo, puderam guardar o raio necessitado. Escalar esta montanha era uma tarefa extremamente complicada. Tal feito merecia uma recompensa. No momento em que recolheram o raio, a montanha começou a mover-se formando um enorme escorrega até à superfície. Quando chegaram lá abaixo prepararam a poção. Agora teriam de encontrar a fonte da origem dos Arco-Íris e derramá-la lá. Depois de muitas pesquisas na biblioteca, por livros e mapas, finalmente encontraram o local procurado.
Quando lá chegaram, para sua surpresa, estava Grey à espera. Sacou da varinha e apontou-a a Bernardo.
– Ousaste desafiar o teu rei e agora pagarás.
Enquanto Bernardo e Grey disputavam uma batalha de luzes, Rosa caminhava em direcção à fonte sem que dessem por nada. Derramou a poção e imediatamente surgiu daquele buraco um Arco-Íris que se estendeu até onde a vista não alcança. Quando Grey se voltou, num impulso, para ver, enfurecido, o que Rosa tinha feito, Bernardo lançou-lhe uma luz que o fez desaparece.
– Muito bem Rosa! Olha, olha como as cores estão a voltar.
– Estamos em Colorida. – disse Rosa sorrindo – Que aconteceu a Grey?
– Na verdade não sei. Aconteceu tudo muito rápido. Limitei-me a movimentar a varinha, não sei que feitiço dali saiu.
– Esperemos que não volte…
Neste dia, em que Colorida voltou à vida, realizaram a festa do Arco-Íris, que passaria para esta data. Subiu ao trono um jovem adulto chamado Afonso, que era amado por todos os habitantes. Bernardo tornou-se conselheiro do novo rei e Rosa seria eternamente lembrada como aquela que trouxera as cores de volta ao reino.
Ao fim da tarde, Rosa estava cansada e foi deitar-se. Acordou com a voz da mãe que a chamava para tomar o pequeno-almoço. Podia ver-se uma ponta de desilusão na sua cara. “Afinal não passou tudo de um sonho”.
Se ela tivesse olhado para a janela antes de sair do quarto, teria visto que Grey estava à espreita, à procura de vingança…
Fátima Cartaxo, 10.º C